Os sinos da igreja ecoavam pelas ruas empedradas da pequena povoação. Os sons apressados das solas dos sapatos de domingo no granito confluíam na praceta central ao som da sétima e última badalada.
Sentada nos degraus frios da velha igreja, está uma criança que atrai a atenção dos crentes. Não é a cor do seu cabelo loiro-acinzentado cortado ao nível dos ombros, nem o casaco de fazenda vermelho, ou a saia de xadrez e meia-calça grossa que os detém. Tampouco o são os grandes olhos negros febris que mantinha fixos num rapazito que um dos curiosos trazia pela mão.
O motivo pelo qual a igreja estava ainda vazia era tão simplesmente o facto de a criança ser desconhecida.
Aparentemente, não era francesa; a menos que não respondesse às questões que choviam sobre a sua cabeça por timidez. Até ao momento em que o pequeno rapaz, objecto da sua atenção inicial, lhe dirige um inocente “Comment tu t’appelles?”. Ela respondeu-lhe com um largo sorriso e pronuncia as seguintes palavras: “Ich me llamo Ema”.
Uma onda de perplexidade e incompreensão percorre a audiência. Não levaram muito tempo a perceber que a menina entendia as questões colocadas, respondendo-lhes inevitavelmente numa miscelânea de línguas variadas, entre as quais reconheceram o alemão e o inglês.
A pequena Ema encontrou-se uma vez mais rodeada de todos os aparelhos passíveis de analisar o porquê de não conseguir estabelecer no seu discurso uma coerência que lhe permitisse comunicar com os seus semelhantes.
Deitada, imóvel, durante o familiar exame cerebral, ia traçando o plano da próxima abordagem, na esperança de que as máquinas não revelassem os seus pensamentos: “Quando sair daqui, vou escolher um sítio calmo para viver. Onde eu possa ter um cão e um monte com relva e flores e silêncio, para me sentar e deixar voar as minhas palavras sem ferir.
Desta vez, não posso esquecer-me de não falar na presença de outras pessoas. Serei muda; inventarei gestos. E, embora não me compreendam no começo, estou certa de que farão um esforço.”
Sunday, September 9, 2007
Era uma vez
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