Saturday, March 1, 2008

Peixe-Voador

Tenho de escrever, e tem de ser já, porque a memória já não é o que era e estou ansiosa por descrever aquela manápula agarrada ao meu copo. Mas, vamos por partes, que a noite foi um crescendo de surpresas e insólitos e, já que tenho de escolher uma ordem para os relatar, que seja a cronológica, para retirar a subjectividade à coisa.

O plano consistia em jantar no novo restaurante do Adolfo Luxúria Canibal, em Braga, que iria iniciar-nos na arte da degustação de sushi. O restaurante esconde-se por detrás da velha Sé de Braga, mais precisamente na rua do Forno, nº 17, numa viela empedrada onde o granito certamente nunca almejou dar forma a um espaço para ingestão de peixe crú. Depois de termos sido devidamente alertados para o sabor intenso das ovas de salmão, peixe-voador e um primo afastado, que o afável proprietário denominou de "navios de guerra", deu-se início ao festim de cores, têxturas e sabores.
No final da refeição, enquanto o saquê arrefecia nos pequenos copos, o Adolfo discorria acerca do Metro do Porto. "Aquilo não é um metro, é um eléctrico rápido", dizia. Eu acho que ele gosta de dar nomes às coisas.

Pedimos conselho aos nativos sobre um bar, situado perto do restaurante e, preferencialmente, onde pudéssemos fumar. O espaço que nos indicaram era muito agradável e explorado por seres tementes à ASAE, a avaliar pela quantidade de luvas de borracha, - das que se compram nas farmácias - que o cozinheiro utilizava para fazer uma tosta-mista.

Não me recordo qual o assunto preciso que discutíamos naquele momento, mas a conversa decorria animada quando, do nada, surge uma grande manápula branca que abre caminho por entre garrafas vazias e levanta o meu copo. A Super Bock Stout deslizou por entre os lábios de um homem alto, de fato, bem-parecido, de olhos e cabelos negros sobre o comprido, que reconheci do restaurante do Adolfo. "Espero que lhe tenha sabido tão bem quanto me estava a saber a mim!". Ele estava completamente, e passo a citar, "descomandado" - penso que consegui adivinhar-lhe o significado - e explicou-nos que o propósito dele às 19h daquele mesmo dia nunca tinha sido ter um jantar frio, de peixe crú. "Eu saí de casa e pensei: Hoje, nada de álcool. Sim, porque eu sou muito amigo do álcool. Vou comer um bife guloso. Mas, o Canibal viu-me passar e disse: Anda cá! - e pronto, ainda aqui estou." Esta personagem, de 38 anos, era professor. Os alunos, que já não via há 4 anos, ainda lhe escreviam cartas, o que ele poderia provar. Era extremamente culto e exprimia-se num português correcto, recorrendo a uma riqueza de vocabulário difíceis de encontrar hoje em dia, pelo menos nas gerações mais novas de professores com quem já tive contacto. O Mirandela, ou Jorge por baptismo, deu-se a conhecer ao longo de uma hora, encostado à nossa mesa, de pé, e estou certa de que a impressão que deixou em mim, deixou-a também em quem mais o ouviu. Em noite de estreia num restaurante japonês, pela madrugada dentro a falar sobre alheiras.

2 comments:

Anonymous said...

É mais uma das noites que nao quero que me saia da ideia, é tão bom estar assim... beijinhossss.

Foi assim que se passou...eu confirmo :)


um muaaaaahhhhhhhhhh

Claudia Ferreira said...

olá Eliana :) parece mesmo q primeiro estranha-se e depois entranha-se, já dizia o poeta! Num destes dias de Junho voltamos a rumar a Braga já sem a ajuda da "catarina", afinal são já caminhos por nós desbravados... O vinho continua óptimo, o peixe cru também acredito q sim, pelo q os meus companheiros relataram e a julgar pela ferocidade com q o devoraram!! "Lembraste da primeira vez q viemos aqui?!" - alguém dizia... Sentimos a tua falta... para partilhar ctg mais esta aventura e 4 meses de vida passada... E o Mirandela tb n marcou presença! :)
Espero q esteja tudo bem ctg nesta nova etapa e q possamos voltar a encontrarmo-nos para comprovar se realmente se entranhou!!
Beijinhos
P.S.: Dá noticias!